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19:35 - 17/10/2023
ULTIMA ATUALIZAÇÃO::
Correspondência aberta #3

Correspondência aberta é uma série de 5 postagens de blog proposta pela artista Ana Cláudia Almeida como parte da programação de encerramento do ciclo 2 do programa de residência Pivô Pesquisa, Desktop Aberto. A artista propõe trocas de imagens entre ela e 5 pessoas convidadas, cujo trabalho já acompanha e com quem já possui diálogo aberto.

 

Cada pessoa convidada envia 10 imagens e recebe 10 imagens de Ana, e ambas criam uma pergunta para cada imagem recebida, a qual é respondida pela mesma pessoa que a enviou. Foram convidadas para esta troca, a curadora Ariana Nuala e artistas Ana Clara Tito, Carla Santana, Iagor Peres e max wíllà morais.

Ana Cláudia Almeida, sem título, 2018, performance realizada na exposição Quimeras

Ana Cláudia Almeida: Acho ótimo que eu não tenho registro quase nenhum desse dia, e às vezes as pessoas aparecem com uns assim meio do nada e eu amo. Fiquei pensando em como essa performance que eu fiz, de pintar em papel na água, conversa com um trabalho seu que também lida diretamente com a efemeridade da obra Imergir ou o Mar num Copo D’água, que foi exposta no Museu da República em Sob Potência da Presença, com curadoria da Keyna Eleison. Queria que você me falasse um pouco sobre este trabalho e o que te motivou a exibir esculturas de argila crua imersas na água.

 

Carla Santana: Engraçado que essa sua performance ilustra um pouco essa minha instalação. A equação entre corpo, água e diluição. A minha série de instalações com argila, água, sal, terra e vidro surgem de uma escuta muito interna: intuição e espiritualidade. Comecei a perceber a minha subjetividade de maneira mais elementar, como se o meu corpo físico fosse feito de terra e o meu corpo espiritual fosse feito de água. Muito disso a partir de sonhos, conversas e consultas. Daí fiquei com uma vontade enorme de tentar ver isso fora de mim. Quando coloco uma peça de argila em ponto de osso, dentro de aquário cheio de água chego num lugar de fusão, dissolução e efemeridade. Enquanto em outras partes da obra tenho objetos corpóreos impenetráveis, imersos ou distantes da água, como o tempo presente onde tudo pode atravessar a minha matéria. Enfim, é uma pira sobre o elementar de mim enquanto essência e comportamento.

Piracema de Pirapora de Davi em processo na residência do Valongo Festival, 2018

CS: O elefante branco rs

O desenvolvimento processual dessa obra conta significativamente com as condições do ambiente, colocando-a num estado de “fragilidade”, assim eu vejo, onde a ação da chuva corrompe a durabilidade da obra. Depois de tantos gastos financeiros e energéticos com ela, como você encara essa relação do tempo de durabilidade? Gostaria que ela ficasse para a eternidade?

 

ACA: Nossa, amiga, eternidade é muito tempo. Esse trabalho ainda está em um lugar de fragilidade, guardado no galpão de uma pessoa que eu não conheço, em um endereço que eu nunca fui. Fico feliz que ele tenha circulado, no Valongo, na Tomie e no Mam RJ, mas queria muito dar um destino um pouco mais definitivo, foi muito perrengue, hoje eu não faria isso que fiz comigo talvez, tendo um pouco mais de bom senso. Queria que me trouxesse algum retorno financeiro, porque foi muita grana e energia gasta, e que mulheres negras depois de mim pudessem vê-lo em exibição daqui a muitos anos.

ACA: Vejo que a linguagem que você vem desenvolvendo com fotografia analógica está muito ligada à vida cotidiana. Eu pessoalmente gosto muito disso, da sensibilidade de saber guardar as pequenas belezas do dia-a-dia, dos afetos, e essa imagem especificamente me trás muito a ideia de vestígios de vida. Por te conhecer e saber que você é muito uma pessoa que cuida do seu espaço de viver, tem cautela com as mudanças, pondera os deslocamentos de estruturas e pessoas por, ao meu ver, valorizar a trajetória do que já foi construído até agora, penso que a fotografia poderia ser uma das maneiras deste cuidado. Como é para você transpor a delicadeza destes momentos pessoais para um espaço expositivo que pode muitas vezes ser frio? Como criar atmosferas de cuidado ao lidar com instituições? 

 

CS: Parte do meu processo em registrar e considerar o meu ambiente de afetos como uma pesquisa artística [ainda em rascunho], está em colocar em primeiro lugar a despretensão como ponto de partida. Ano passado eu senti muito o rolê de produzir a partir de uma demanda externa. Tem uma exposição, não quero colocar nada do que eu já tenho, vou produzir algo novo. E nesse momento, eu não to pensando em expor nada. Estou emburacada. Porém, sei que daqui a pouco vou colocar isso no mundo. E eu sinto que quando vai para o espaço expositivo muitos desses cuidados e relações extremamente pessoais já se descolam. O discurso muda, cria-se a ladainha conceitual e formas de pendurá-lo na parede. Daí acho que vale o autocuidado enquanto criadora de perceber como expor, onde expor, o que dizer sobre e, o que pra mim é muito importante, quem irá ver.

O que a gente sente da coisa sem a coisa. Oficina realizada por Trovoa RJ no Galpão Bela Maré

CS: Esta foi uma oficina realizada com crianças no Galpão Bela Maré, onde de primeira todas sentiram dificuldade de se expressar a partir do abstrato. Como você sintetizaria o lugar do abstrato na nossa imaginação? Porque esse transporte expressivo de uma ideia, pensamento ou emoção para uma abstração pode ser tão difícil?

 

ACA: Quando a gente é bem criança mesmo, menor que essas crianças que tinham entre 7 e 11 anos, tudo que a gente desenha é meio abstrato né, parece que o prazer é só espalhar a cor no papel, mas aí logo vão ensinando a gente a desenhar ícones, de árvore, de gente, de casa, nada parece muito com o que é de verdade, já reparou nos galhos das árvores da vida real? Que doideira aquela torção toda? Acho que tudo que a gente aprende muito muito cedo é difícil de desvencilhar da nossa ideia de mundo e de certo.

Desdobrando fardos, 2019

ACA: Fardo foi uma série fotográfica e performática que você realizou em um lugar privado e sem público. Em Desdobrando Fardos você teve o desafio de dar continuidade à série, desta vez com pessoas assistindo o ato performático. Eu sei que você não convidou nenhum dos seus amigos para assistir, com exceção da Rafaella Menegueli, com quem você já tinha uma relação de longo prazo e que foi quem fez o registro fotográfico. O que te influenciou a tomar a decisão de realizar a performance aberta nesta ocasião específica e o que te motivou a garantir que o público em geral não tivesse já uma ligação com você ou com seu trabalho?     

 

CS: Na real além da Rafaella que fez o registro, a Jade Zimbra acompanhou toda a preparação para essa performance e me direcionou muito. Ela disse: “Isso é sobre o seu vínculo com este material, explora a relação da argila com o seu corpo. Isso vai te conduzir.” Desde que criei o “Fardo” na intimidade do meu quarto eu já pensava em dividir essa experiência. Primeiro pensei em fazer com outras pessoas e depois desenhei partituras corporais criando uma cena. E por muito tempo ficou só nesse desenho. Aí chegou o convite de participar da programação do evento Quinta Black no Sesc São Gonçalo, da onde eu sou cria. Foi especificamente esse lugar que me inspirou a performar, pela memória afetiva de ter começado a atuar no palco do Sesc e por isso me sentir em casa. E pra mim já existia a ligação com  o público por essa questão territorial. E foi muito doido o quanto eu me entreguei, falei a beça durante a ação e senti cada pessoa se aproximando de mim. Foi uma puta experiência.

Maymont, 2017

CS: Nessa pintura eu vejo e me recordo dos seus relatos sobre o intercâmbio e as chaves que você virou lá. Com esta obra consigo me lembrar de você falando sobre suas memórias aquáticas, que viraram um dos assuntos principais das suas pinturas. E para além das memórias aquáticas? Se você tivesse que falar do começo da sua trajetória na pintura sem citar esse assunto, o que seria dito? 

 

ACA: Acho que quando eu comecei a circular no meio da arte ainda estava muito emocionalmente ligada ao James River, e era difícil demais falar da pintura sem falar disso. Hoje tem muitas coisas do meu interesse em pintura que poderia falar sem nem tocar nesse assunto, como a ideia de transformação contínua, a relação com o tempo, o respeito pela efemeridade, a relação com o espaço e a ideia de paisagem.

Imergir ou o mar num copo d'água, 2019

ACA: Falei já sobre este trabalho na primeira pergunta, mas queria comentar agora de um trabalho precede este e que foi exibido na exposição Noite, no Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica, durante o Levante Nacional Trova. O trabalho “Aprofundar ou A vida como um lago de águas paradas” tem uma estrutura similar a este da imagem de alguma maneira, são 3 esculturas de argila crua sobre 3 aquários cheios, uma distante da água, outra bem próxima, e a terceira parcialmente imersa. Durante a residência no Hélio Oiticica que precedeu a exposição, eu pude testemunhar um pouco da idealização do trabalho, e sei que antes dele houve um longo processo de escrita, que pode estar direta ou indiretamente ligada ao feito, e que parte dele é também fruto de uma série de sonhos que você teve. Você pode contar sobre a relação da escrita com a sua prática num geral e desta experiência de materializar algo estava totalmente no seu subconsciente?

 

CS: Olha eu acho que estou me distanciando da escrita, infelizmente. Hoje em dia só escrevo em tópicos e isso me irrita. Parece que deixei a minha lírica em 2012 onde escrevia muito. Esses dias até encontrei um punhado de escritas automáticas que eu fazia e pensei em retomar esse exercício.  A minha escrita que precede os trabalhos é muito mais objetiva, um lembrete de ideias. Depois do trabalho feito sempre escrevo um pouco sobre mas sinto uma superficialidade na maioria das vezes. Já falei um pouco sobre isso de materializar o meu subconsciente na primeira pergunta. Uma coisa muito satisfatória pra mim foi delinear e perceber agora os ciclos na minha produção. De prima, eu precisava falar sobre dores, denúncias e descontentamentos. Depois eu entrei nesse ciclo de tentar jogar pro lado de fora algumas mensagens que se repetem, fundamentos que me perseguem. É um fluxo: imergir para emergir.

Sem título, 2020

CS: Lembro muito de você falando que queria poder aprofundar mais os seus estudos com tinta óleo e como é um material de alto valor aquisitivo. Qual característica mais te interessa na tinta óleo? E como certas convenções sobre técnica, material, suporte influenciam no seu trabalho? Já discutimos um pouco sobre o valor da pintura no mercado, como você justifica o valor das suas obras.

 

ACA: Minha formação não é em pintura, mas o que eu aprendi foi com óleo, e é muito bom porque tem esse tempo próprio que ensina a viver. Mas tem uma coisa de acesso a material no Brasil que é muito difícil, no Rio por exemplo quase não tem mais lojas especializadas em material artístico e as poucas que têm quase não possuem variedade. Se você não está disposto a pagar 100 reais em um tubo de 120 ml, você precisa usar tintas nacionais, e a pigmentação piora muito nesse caso, acho que a pigmentação das óleo nacionais melhor do que das acrílicas, aí acabo usando óleo por isso, aí entre pagar caro em uma acrílica melhor e comprar uma óleo, prefiro a segunda opção. Muitos trabalhos meus são fruto de processos longos de pintura, com muitas etapas, venderia mais barato se fosse mais rápido, tanto é que os desenhos são bem mais acessíveis que as pinturas e eu quero que continuem assim.

Antonia

ACA: Neste processo de correspondência que estou fazendo com vocês, fotos de familiares estão sendo muito comuns. No texto Vivendo de Amor, bell hooks fala da importância da criação de relações plenas de afeto para mulheres negras e pensei muito neste texto quando vi esta fotografia. Eu, que me identifico como uma mulher negra cis heterossexual, tenho pensado muito sobre perspectivas de envelhecimento, família e amor não heteronormativas, no sentido de construir relações duradouras, de acolhimento, e de apoio recíproco para além da ideia da tão falada hoje família tradicional. Acho que para nós, pessoas negras, projetar futuro muitas vezes é difícil, e é lindo quando podemos olhar para nossos ancestrais recentes, mães, avós, e ver o quanto elas percorreram para chegar até aqui e para que nós chegássemos até aqui. Então me conta, Carla, como é futuro para você, o que você projeta quando pensa nisto?

 

CS: Olhando para as minhas avós eu vejo muito de futuro. Penso que eu quero ser e estar velha. Tudo isso com conforto, claro rs. Vida longa e próspera me atraem. A idealização de relações duradouras também.  Antes eu pensava muito naquela história de deixar um legado… Agora, minha filha, eu só penso em estar aonde eu quero estar na paz, sem nada enchendo muito o meu saco.

 

Sem título, 2019

CS: Como você se preocupa com a escolha das cores nos desenhos, especificamente? Onde há uma quantidade limitada de cores devido ao uso do pastel oleoso. E se cor e forma tivessem algum tipo de relação afetiva, qual seria? [Mãe, pai, namoradas, primas…]

 

ACA: Na paleta do pastel não tem muito como fugir ou super escolher, tem cores que eu bato o olho e gosto, e aí quando acabam vou trocando. Gosto de usar algumas cores bem próximas, irmãs, aí combino uma delas com uma namorada, que é diferente mas tem a ver. E por fim chamo aquela prima diferentona que ninguém sabe muito porque saiu assim, aí elas ficam conversando ali.

Kevyn Mota em gravação do videoclipe OkOkOk de Gilberto Gil

ACA: Grandes momentos rs! Fazer direção de arte para um vídeo-clipe do GIlberto GIl, que privilégio, e ainda de um jeitinho tão nosso, direção compartilhada por 4, eu, você, Laís Amaral e Ana Clara Tito. Amei ver essa foto do Kevyn Mota no set de gravação do clipe de Ok Ok Ok,  é nosso primeiro trabalho coletivo como Trovoa. Sempre tenho muita dificuldade de vislumbrar os horizontes da criação em grupo, acho difícil pensar junto, me deixa ansiosa. Você por outro lado geralmente colocava muita fé em coletivamente, e as minha experiências com vocês me provaram por equações muito loucas que não só é possível, mas também enriquece muito, o nosso intelecto e o resultado do trabalho. Você tem vontade de ainda fazer mais trabalhos artísticos em colaboração? Quero dizer, este lugar é importante para ti? Vamos fazer uma colab rs?   

 

CS: VAMOS ÓBVIO! Sim, é um terreno muito fértil para mim. Herdei isso do teatro. Me dar um ânimo trabalhar junto, a coisa da complementaridade. E neste momento de isolamento social eu pude perceber ainda mais como isso me afeta. No começo estava completamente travada, mas, a medida que voltei a trocar ideia com outras pessoas, retomar projetos isso me deu um gás na vida.

Realengo, Madureira, Zona Sul, você

CS: “Você” está aonde?

 

ACA: Do lado de fora.

O Deus da Cabeça, Mario Cravo Neto, 1995

ACA: Essa fotografia me leva para uma reflexão de identidade, rostos, nomes, elementos que individualizam as pessoas negras. Tenho visto nas práticas artísticas de pessoas negras na contemporaneidade, e realmente não sei dizer se só hoje ou no passado também, o uso habitual de imagens ou figuras de corpos negros sem face, ou com a face escondida. Me pergunto quais significados isso pode trazer, o ato de ocultar aquilo que individualiza, num momento em que ser reconhecido como indivíduo, ser único, é tão almejado por nós. Sei que você também oculta os rostos de figuras humanas em muitos dos seus trabalhos tanto de escultura, quanto de desenho ou pintura, e me interesso em ouvir você falar sobre esta ação e o que te leva a ela. 

 

CS: CACETE ANA EU TENHO MATUTADO MUITO SOBRE ISSO

Veja bem, a primeira vez que eu deixei o rosto em branco numa pintura foi na residência no HO. Perto da montagem da exposição estava eu em crise sobre que rosto aquela pintura teria. Daí consultei a Laís Amaral e ela falou: “Você acha que está pronto? Se sim, é isso” E eu de fato constatei que estava acabada. Só que olhando ao meu redor agora, nenhum desenho ou pintura tem face. E eu não tenho uma resposta. Vamos conversar mais sobre isso?

Penso que pode ser uma zona de conforto em prol da composição, talvez. Ou deixar em aberto para projeção de múltiplas caras. O mais complicado é que num trabalho meu, “Subjetivo Interdito”, o rosto coberto traz a violência, a massificação e essa interdição do eu num viés de denúncia, repúdio. E agora olhando as minhas pinturas vejo uma contradição? Logo eu que odeio me contradizer. Será que o medo de botar a cara é o medo de botar a cara? Preciso discutir mais sobre isso, pensar nas interpretações e mergulhar numa pesquisa imagética para sistematizar esse limbo descarado que eu estou me metendo.

Andréa Almeida, 2014

CS: Acho muito singular a relação de mãe e filha envolvidas no universo artístico, acho que nunca vi muito de perto. Quais são os conselhos que vocês se dão? Como a arte aproxima vocês?

 

ACA: Eu sou artista por causa da minha mãe e minha mãe é artista por causa de mim, basicamente. Ela me incentivou a gostar de arte desde nova, e a coisa foi se desdobrando até chegar aqui. Aí uns anos atrás ela passou no vestibular para história da arte, e começou a se envolver com arte mais diretamente. Minha mãe lê bastante e às vezes fica compartilhando comigo saberes das leituras dela, eu por outro lado ajudo ela a lidar com o hype do circuito, que eu vejo que a intimida muito, por ser muito distante do seu contexto cultural, que foi uma coisa que eu senti muito quando entrei na graduação de design também, e que hoje na arte acho suave, porque o design era muito pior. Então sei como é difícil, são ambientes muito hostis para pessoas negras de periferia, ainda mais quando não se tem mais 20 anos.

Sem titulo, 2020

ACA: Gosto tanto dessa pintura, acho tão bom como ela ultrapassa os limites da folha, como se não respeitasse o espaço que foi destinado a ela. O movimento que acontece ali, as linhas fazem os olhos dançar na página, me traz a ideia de um corpo pendular, que se move para um lado e outro, e que está envolvido, protegido, por uma camada fluida a qual  intermedia sua relação com o exterior de forma gentil. Pra mim é muito presente em tudo que você faz a sua relação com as artes cênicas, que é um dos seus primeiros contatos profissionais com o meio artístico, o corpo hábil para o mover. Você sente essa influência muito forte ainda? Te interessa estreitar novamente seus laços com o teatro no futuro de alguma maneira? 

 

CS: Que contribuição gentil, obrigada! Sinto uma influência muito forte do teatro tanto nas minhas memórias corporais quanto na teoria, vira e mexe eu revisito algum texto sobre. Eu me desiludi com o teatro formal. Tenho a pretensão de criar um grupo de estudos experimental sobre teatro-dança, venho maquinando isso há anos, uma hora sai.

Ana Clara Tito, Ana Cláudia Almeida, Carla Santana e Laís Amaral, sem título, 2020

CS: Primeiro, qual nome você daria para essa pinturona? Larguei hahaha…

Essa foto me trouxe uma sensação de reconhecimento que eu ainda não havia sentido. Acho que ainda não estamos conscientes ou diminuímos as nossas conquistas, não falando das expectativas do sistema de arte, mas sim de tratar com afeto e consideração os nossos feitos juntas. Pra você, qual seria o cenário ideal para exibir essa pinturona? Da gente se olhar e se sentir orgulhosas. 

 

ACA: Sem nome. Eu acho que qualquer lugar em que ela coubesse e ficasse bem instalada, com uma boa iluminação, já me deixaria extremamente feliz, porque ela faz a ocasião. O difícil é, onde expor essa coisinha de 18 x 13 m de algodão? Não sei onde caberia.

Torando, 2020

ACA: Acho o máximo o conforto que essa pintura me propõe, a mulher está acomodada numa faixa comprida de areia, e no plano de trás o seu lugar está guardado na sua cadeira. É como se praia fosse só dela, não tem mais ninguém na cena, essas horizontais fortes e os poucos elementos criam uma estabilidade e uma tranquilidade para a imagem que são quase de dar inveja, penso “Ah como eu queria estar bem assim!”. Carlinha me chama pra fazer uma residência na sua casa e ir pra praia de bike diretão? 

 

CS: Está mais do que convidada. Aliás, seria um luxo aquele encontro novamente em Rio das Ostras. O famoso vamos marcar. E a pintura é realmente esse lugar do conforto. É também sobre o exercício de imaginação. Imaginar que está indo para praia, arrumar a bolsa e ir para laje, onde o peito pode escapar do biquíni confortavelmente.

Aula uff

CS: O que eu mais gostei dessa aula que fizemos foi poder falar do trabalho de outras artistas da Nacional Trovoa que nos marcaram pessoalmente. Se você tivesse um museu no seu bolso, para sacar em qualquer lugar, quais artistas do Trovoa estariam lá dentro?

 

ACA: Você quer me jogar na fogueira, né? Para escolher assim as minhas pesquisas preferidas na cara dura :S Mas, gosto muito do trabalho da Thays Chaves, da Heloísa Hariadne, Deba Tacana, Aline Furtado, da Biarritzzz, Castiel Vitorino e Juliana dos Santos.

Vulcão El Totumo

ACA: O que eu acho louco nessa foto é pensar que uma coisa que a gente considera suja todo dia num outro contexto é diversão e faz bem. Mudança de contexto transforma totalmente as coisas. Como uma pessoa com espírito viajante como você já foi afetada pelas mudanças de contexto que pôde viver? 

 

CS: O que me instiga a viajar é muito esse lugar da descoberta e imprevisibilidade. Coisas comuns podem virar grandes coisas. Você se abre para tudo e todo encontro é uma possibilidade. Me sinto uma outra pessoa viajando porque me deixo levar. Um exemplo foi quando viajei de carona com uma amiga, para mim que prezo pelo conforto e pela segurança foi restaurador, conheci um outro lado meu.

Encerramento da exposição Noite, de Trovoa RJ, no CMA Hélio Oiticica

CS: Por último, se o Trovoa RJ (eu, você, Laís Amaral, Ana Clara Tito, Jade Zimbra e Keyna Eleison) fosse uma banda, qual estilo tocaríamos? E determine também quais os instrumentos cada uma tocaria.

 

ACA: Ai eu acho que seria alguma coisa instrumental bem experimental doida e você tocaria sax com certeza. A Laís tocaria trompete, a Clara bateria, a Keyna cantaria, bem performer, jade tocaria harpa e eu xilofone ou piano.

 

Carla Santana (Rio de Janeiro, 1995), graduanda em Artes na Universidade Federal Fluminense. Adentrou ao universo artístico a partir do teatro, onde atuou em duas companhias: Terraço Artes Integradas e Mundé. Co-fundadora e articuladora do movimento nacional Trovoa. Sua produção é composta por múltiplas visualidades como o desenho, pintura, colagem, escultura, fotografia, vídeo e performance. Parte da ideia de que toda imagem é texto; e do corpo como dispositivo fundamental de expressividade. Busca externalizar e investigar as relações sutis entre o corpo-subjetivo e o corpo-social, uma via de mão dupla. Exprimindo que a intelectualidade é gerada e movida da cabeça aos pés.

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