Pivô presents the group show “Brazil: Arbeit und Freundschaft,” conceived by artist Pedro Caetano. Caetano proposes an exhibition about precisely the three elements contained in its German name: Brazil, work and friendship. The project promotes a reflection on the processes of curatorship and the institutional relationships in structuring an exhibition from social relationships and the coexistence of artists without mediation in the Pivô space. Marcel Duchamp stated that he did not believe in art, but rather in artists. Following this line of thinking, the project discusses the role of the curator by giving the project’s participants complete autonomy.
The participating artists were selected as such: Caetano, as the project’s creator and first artist, invited a personal friend, who’s also an artist to exhibit the work of his or her choice at Pivô. After accepting, this second artist then invites another artist friend, thus continuing the process until 20 participants are on board. The invited artists choose the work to be displayed and are unaware of the other participants, except for the one friend who invited them.
The objective of this dynamic is to reveal certain tendencies and “cliques” in Brazil’s visual arts scene through an experiment proposed and conducted by artists themselves. The process of constructing the exhibition is as important as its result, to the extent that it becomes an object of study and allows the possibility for a good-humored diagnosis of the Brazilian art market itself. This “word of mouth” structure of the list of artists opens a series of discussions about the internal functions of the visual arts medium at the same time promoting a democratization of the curatorship procedures, opening space for unlikely dialogues and reflections that did not arise from an exhibition with a preconceived theme.
In the context created by Caetano, each artist is lord and master of their own work and actively participates in the process of composing the set of artists in the exhibition, in which the formed set is a reflection on the reach of this network of interpersonal relationships. The project expands the public’s relationship with the works, exposing the very function of the social milieu in which the artists exist.
To construct an efficient reflection of the circuit which he intends to question, Caetano placed just one restriction: that the “friend selected” be a professional visual artist. In the artist’s words: “This excludes the possibility that elements from outside the arts circuit enter the exhibition and that it loses its capacity to be indicative of this circuit; and it would thus sustain choices made based on friendship – the social bonds synthesize the joy of the exotic Brazilian people. From this same tone comes the choice of the exhibition’s name, because ‘it’s proven that it’s only possible to philosophize in German’; and it is also proven that a large part of the contemporary art world revolves around the enormous collections, artists and curators from that European country.”
The 20 artists who were “self-selected” through the method proposed by Pedro Caetano are: Marcius Galan, Marcelo Cipis, Jac Leirner, Antonio Malta, Paulo Monteiro, Suiá Ferlauto, Roberto Freitas, Marcelo Comparini, Barbara Rodrigues, Rodrigo Andrade,Shima, José Alberto Bahia Duarte, Henrique Detomi, Alice Lara, David Almeida, Thales Noor Rocha Nobre, Gregório Soares, Ana Rita Sousa Almeida, Débora Sousa Amor.
Brazil: Arbeit und Freundschaf
Brazil
Trabalho
Arte e amizade
157 curadores e nenhum artista
Um dia, um amigo, um artista, me contou ideia que teve pra uma mostra.
Ele disse, com sua dicção gentil e metódica: é uma exposição em que um curador convida doze curadores (pausa); e cada um desses curadores convida outros 12 curadores (pausa); e esses 157 curadores montam uma exposição… Sem nenhum artista.
Achei a ideia fabulosa. Esse amigo tem um jeito mecânico de organizar o mundo com uma clareza formidável.
A exposição funcionaria bem como exemplo de certo tipo de mecanismo da arte contemporânea que privilegia as ideias em torno do trabalho de arte em detrimento desse mesmo trabalho e demostraria a impossibilidade da arte sem artistas.
Aquilo acionou um gatilho na minha cabeça: um pêndulo foi ativado no espaço entre o cerebelo e o fundo dos olhos; e retornava quase todo dia pra me assombrar.
Arte, contexto e assombração
Em 2012, uma amiga me liga – uma artista, e convida pra participar de uma exposição sem curadoria. Qualquer trabalho, de qualquer pessoa, entregue entre os dias x e y, seria exposto. A proposta era baseada nas experiências de um artista californiano dos anos 60.
Esta mostra aconteceu paralela à Bienal de São Paulo, reuniu artistas desconhecidos e famosos, gerou protestos, entusiasmo, escárnio, admiração e atenção modesta da mídia, curadores e galeristas. A não curadoria resultou num assemblage eclético: os mais variados tipos de trabalhos ocupando o grande e luminoso galpão do Liceu de Artes e Ofícios, organizados somente pela ordem de chegada das obras. Interessante ver uma mostra que não respeitava modismos, maneirismos, tendências de mercado ou a objetividade científica de um curador aplicado; uma exposição pautada somente pelo desejo dos artistas de expor.
A minha impressão final foi amarga: lembro de muita gente, na maioria profissionais da arte, rindo dos trabalhos alheios; principalmente daqueles mais ingênuos, desprovidos dos recursos retóricos do discurso da arte contemporânea. Por outro lado, vi também que mesmo os trabalhos de artistas famosos, deslocados do contexto higiênico e provedor de significantes da galeria ou do museu, encontravam pares quentinhos no meio daquela maçaroca visual assombrosa.
Elegia e subjetividades na bandeja do quilão
Então, outro dia, fui almoçar em restaurante a quilo com outro amigo, artista. Ficamos em pé na fila, segurando as comandas de plástico engordurado, esperando enquanto cada pessoa organizava seu prato. Cada um criando combinações ora ordenadas por um tipo de cartesianismo prudente – como a jovem de terninho executivo risca de giz, cabelos com pontas repicadas voltadas pra o pescoço e tatuagem discreta no peito do pé: saladinha bem montada, com palmitos cruzados sobre as folhas, o molho metodicamente colocado sobre a obra; uma quantia ínfima de arroz sete grãos e dois bifinhos com cogumelos igualmente sobrepostos formando um ângulo obtuso. E bastante respiro de louça branca pra emoldurar. Um tipo de composição mimética que não oferece muitas dicas sobre as subjetividades da autora, senão certa aspiração à elegância. Ou em outro caso, ordenadas pela objetividade ansiosa, brutal e sincera do jovem estagiário da firma de advocacia: sushi sobre pasta, ladeados por fritas e carnes variadas em composição expressionista abstrata.
E assim, em pé na fila, observei a curadoria que cada um exercia no seu prato, tentando entender que forças objetivas e subjetivas poderiam envolver cada composição. A fila andou, fiz minha própria seleção: pautada pela norma restritiva do repúdio ao alho, antes de qualquer outra subjetividade eletiva.
Com o prato montado fui sentar com meu amigo, o outro artista.
Mas antes, tive um breve contato com:
A matéria escura que mora entre o cerebelo e o fundo dos olhos
O pêndulo da mostra sem artistas voltou, acompanhado da lembrança da experiência no Liceu, e levou junto as subjetividades expressas pela elegia no balcão do quilão. E num estalo se formou – entre o cerebelo e o fundo dos olhos – uma ideia: uma mostra de arte brasileira organizada sem a figura de um curador, em que cada artista elege seu próprio trabalho e convida outro artista, outro amigo artista.
Sobre a magia da interlocução
Meu amigo, olhos fundos, míopes e curiosos, comendo sua própria obra no quilão, falava alguma coisa sobre os velhos tempos não tão velhos da galeria Polinesia. Eu ainda um pouco absorto, tentando juntar os fragmentos daquela ideia que ia se formando atrás do fundo dos olhos; tentando também julgar o que fosse necessário processar e o que não dizer, disse: tive uma ideia pra uma mostra; eu apresento um trabalho e chamo um amigo pra participar da mostra, sem ver seu trabalho, sem perguntar nada sobre o trabalho, pra participar só pela amizade. Ele faz a mesma coisa e assim sucessivamente, até chegar nuns 18 ou 25 artistas.
Ele gostou do que eu tinha dito. Eu continuei: não é uma boa? Uma mostra que exemplifica como a “miguxagem” é realmente o fio condutor de quase toda curadoria de mostra coletiva no Brasil, de como o mérito e a qualidade do trabalho ficam em segundo plano, de como a impossibilidade da crítica entre amigos nivela o trabalho por um padrão imperativo de mediocridade. Ele me olhou e disse: não acho nada disso, acho uma exposição bonita pra caralho sobre a amizade e a coletividade.
(E então eu me lembrei daqueles círculos preenchendo uns aos outros espaços na apostila de Teoria da Comunicação I, no fim dos anos 90, na Faculdade de Comunicação. O da esquerda chamado de ‘emissor’, o da direita de ‘receptor’ e do meio de ‘sinal’, ou alguma coisa do tipo; e lembrei também que bem no meio deles fiz um retrato de Jacobson com óculos grossos e paletó, copiando do power point da professora).
Rilke, asfalto e a marginal do Tietê
Em 2003 eu levava pra o aeroporto uma amiga, uma artista, alemã. Ela ia voltar pra Hamburgo depois de três meses no Brazil. Eu e ela no meu Ford fiesta azul rasgando a marginal do Tietê enquanto tentava trafegar pelas partes menos acidentadas da via, aprumando o braço pra vencer as estranhas curvas que acompanham a aceleração centrípeta, ao invés de forçar o carro para o lado de dentro da curva com a física a favor das possibilidades.
Passando o Canindé, atravessamos um trecho recém-asfaltado — aquele cheiro preto de asfalto ainda quente entrando pelas janelas do carro. O curioso é que a pista não estava plana — parecia que uma estrada vicinal encharcada de lama tinha sido coberta de asfalto depois da passagem de uma tropa de bois.
Aí ela falou, com aquele sotaque característico dos alemães falando inglês: eu não entendo, porque vocês asfaltam as ruas se elas vão continuar parecendo estradas de terra — não era mais barato ter estradas de terra?
Eu não tive muita resposta, além de dar risada. Nem todo Weber do mundo comparado a todo Sérgio Buarque de Holanda iria explicar pra minha amiga a diferença entre o MÉTODO alemão e o “método” brasileiro.
Eu pedi pra ela refazer a mesma pergunta em alemão, que sempre me soou como a língua mais bonita. E o som que saiu de sua boca parecia Rilke, mesmo que fosse só sobre asfalto, estrada e terra.
Tendo isso em vista, aqui em 2013, resolvi que um nome alemão seria denotativo da tentativa de criar uma experiência analítica, a partir de um ponto de vista ‘estrangeiro’. E é claro, está provado que só é possível filosofar em alemão… além de soar bonito demais.
Todas as partes da equação colocadas, a soma é:
Brazil = – Arbeit + Freundshaft ou
Brazil = (arbeit X freundschaft)
ou
Brazil = arbeit
freundschaft
Pivô presents the group show “Brazil: Arbeit und Freundschaft,” conceived by artist Pedro Caetano. Caetano proposes an exhibition about precisely the three elements contained in its German name: Brazil, work and friendship. The project promotes a reflection on the processes of curatorship and the institutional relationships in structuring an exhibition from social relationships and the coexistence of artists without mediation in the Pivô space. Marcel Duchamp stated that he did not believe in art, but rather in artists. Following this line of thinking, the project discusses the role of the curator by giving the project’s participants complete autonomy.
The participating artists were selected as such: Caetano, as the project’s creator and first artist, invited a personal friend, who’s also an artist to exhibit the work of his or her choice at Pivô. After accepting, this second artist then invites another artist friend, thus continuing the process until 20 participants are on board. The invited artists choose the work to be displayed and are unaware of the other participants, except for the one friend who invited them.
The objective of this dynamic is to reveal certain tendencies and “cliques” in Brazil’s visual arts scene through an experiment proposed and conducted by artists themselves. The process of constructing the exhibition is as important as its result, to the extent that it becomes an object of study and allows the possibility for a good-humored diagnosis of the Brazilian art market itself. This “word of mouth” structure of the list of artists opens a series of discussions about the internal functions of the visual arts medium at the same time promoting a democratization of the curatorship procedures, opening space for unlikely dialogues and reflections that did not arise from an exhibition with a preconceived theme.
In the context created by Caetano, each artist is lord and master of their own work and actively participates in the process of composing the set of artists in the exhibition, in which the formed set is a reflection on the reach of this network of interpersonal relationships. The project expands the public’s relationship with the works, exposing the very function of the social milieu in which the artists exist.
To construct an efficient reflection of the circuit which he intends to question, Caetano placed just one restriction: that the “friend selected” be a professional visual artist. In the artist’s words: “This excludes the possibility that elements from outside the arts circuit enter the exhibition and that it loses its capacity to be indicative of this circuit; and it would thus sustain choices made based on friendship – the social bonds synthesize the joy of the exotic Brazilian people. From this same tone comes the choice of the exhibition’s name, because ‘it’s proven that it’s only possible to philosophize in German’; and it is also proven that a large part of the contemporary art world revolves around the enormous collections, artists and curators from that European country.”
The 20 artists who were “self-selected” through the method proposed by Pedro Caetano are: Marcius Galan, Marcelo Cipis, Jac Leirner, Antonio Malta, Paulo Monteiro, Suiá Ferlauto, Roberto Freitas, Marcelo Comparini, Barbara Rodrigues, Rodrigo Andrade,Shima, José Alberto Bahia Duarte, Henrique Detomi, Alice Lara, David Almeida, Thales Noor Rocha Nobre, Gregório Soares, Ana Rita Sousa Almeida, Débora Sousa Amor.